quinta-feira, 21 de maio de 2009

A jaula


Saudações.Estou meio sem estro ultimamente.Meio sem tempo também..Acho que na verdade só estou postando algo porquê me acordaram antes do combinado..Mas pasme!Minha falta de estro,creio eu,é por motivos positivos..mais pra frente eu conto o que é..

Bisous *:

Como prerrogativa : segue um belíssimo conto do meu querido Victor..



A Jaula
Ansioso. Estava prestes a sair daquela jaula. Um misto de asco e nostalgia lhe amargou o coração. Por ora estava bem. Mesmo que as cicatrizes pelo corpo, por dentro e por fora, latejassem. Por um momento até admirava-as. Lembrou-se então de como tudo começou. Não lembrara se viera de ovo, de útero ou de uma espécie de bactéria cósmica mutante. Sabia que desde que nascera tentaram corta-lhe as asas.Tentavam em vão. Regenerando-se iam conforme a passava a dor. Eram o que mantivera-lhe vivo. Esperando, sempre. Aspirando voar em outros céus, nadar em outros mares, flertar com novas flores e admirar tudo que lhe era direito. Entretanto por intermitências do destino nascera naquela maldita jaula. Jaula que não só impedia-o de voar, mas que era desumana. Humanos; tinha um fascínio receoso por essa espécie. Ele próprio aparentava ser um. Mas não era. Sabia, em seu âmago sentimental, que era diferente, que era nobre, um espécime em extinção. Contudo havia a jaula. O cheiro do ralo que nela imperava e os ratos que dele saiam para rirem de sua impotência lhe irritavam. Sabia que era melhor que os ratos. Melhor que os humanos. Alias, sabia que era melhor que os ratos e os humanos juntos. Mas daí sucumbia em dor. Lembrou-se então dos moleques insolentes que vinham lhe atirar pedras. Somou as magoas e pensou então ser nada. Era chacota, um mero bicho. Refletiu por alguns minutos. Engoliu o choro. Não engoliu o choro. Desmanchou-se no choro. Chorou um choro úmido pelo sofrimento da incompreensão e de intermináveis soluços. Soluços que machucavam a garganta. Vomitou, então. Vomitou tudo o que lhe engasgava. Dos transeuntes que ali passavam, uns intimidaram-se e protegeram-se de tamanha brutalidade, outros por sua vez acharam poético. Nem reparou mais na jaula e nem naqueles que do outro lado transitavam. Sentiu-se aliviado. Pensava na liberdade, nos mares, nos céus e nas flores. O otimismo havia retomado seu espírito, e o juízo também. Então sentiu uma pequena vergonha de ter duvidado que debaixo daquelas plumas e escamas cintilantes que ostentava batia um coração e argumentava um cérebro. Recuperou as energias. Era tão exótico e tão delicado que os admiradores da jaula não podiam entender a complexidade daquele ser. Chegou então a hora. As asas quebradas já estavam sãs. Bateu, bateu, bateu com a força de um vulcão contra aquelas paredes translúcidas como vidro e duras como chumbo. Arrebentou-a. Sentiu a primeira brisa de ar puro. Cheirava à liberdade. Caminhou timidademente por um tempo, admirou-se com as coisas mais ínfimas e as idolatrou. Era aquilo que importava. Tomava coragem para entregar se como entregam-se os suicidas. Eis que sente uma pontada. Acertaram-lhe novamente. A pedra do estilingue era cada vez mais ríspida e densa. Acertaram a asa direita. “Aproximam-se cada vez mais do coração” pensou. Deslizou até o chão e foi carregado de volta à jaula. Desejou nunca ter tido asas. Agonizou e chorou. E o ciclo de emoções se repetira. Mas os ratos e humanos, os humanos-ratos, nunca cortaram suas asas.
Victor Hugo Silveira Simões.

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